Pesquisa

Monitoramento ecológico

Análise comparativa de custo-efetividade: condução da regeneração e plantio total

Conforme descrevemos na página sobre Restauração Ecológica, implantamos áreas experimentais de condução da regeneração natural sob diferentes formas de manejo. Também implantamos áreas com plantio de mudas em área total, uma forma de restauração que é mais convencionalmente utilizada, porém tem custo financeiro mais alto.

Monitoramos todas essas áreas por 3 anos (2022, 2023 e 2024) em relação a indicadores de desenvolvimento da vegetação nativa arbórea e arbustiva.
O protocolo de coleta de dados em campo foi elaborado seguindo as recomendações do Protocolo de Monitoramento para Monitoramento de Projetos e Programas do Pacto pela Restauração da Mata Atlântica e de acordo com o exigido pela legislação estadual - Resolução SMA 32/2014, conforme orientações da Portaria CBRN 01/2015. A elaboração do protocolo e da estratégia de amostragem teve auxílio da Profa. Dra. Simone A. Vieira, do LEME/UNICAMP.

Dessa forma, pudemos comparar os indicadores de desenvolvimento da vegetação nas diferentes situações de manejo, bem como seus custos, o que nos permitiu fazer uma análise de custo-efetividade que será apresentada nesta seção.

Realizamos a amostragem por meio de parcelas de 100m2 (25 m x 4 m) distribuídas uniformemente pelas áreas em restauração.

Vista aérea da parcela amostral de 100m2 (Fonte: Portaria CBRN 01/2015)

A quantidade de parcelas foi calculada de acordo com o tamanho da área, como o número de hectares + 4 (por exemplo, uma área de 2 hectares teve 6 parcelas).
Em áreas com menos de 1ha foram instaladas até 5 parcelas, dependendo do tamanho e condições de relevo. Nas áreas de condução de regeneração natural foram implantadas 2 parcelas em cada tratamento (todas com tamanho inferior a 1ha).

Os dados foram coletados sempre na estação seca: maio-julho de 2022, junho-agosto de 2023, e julho de 2024.

Os principais indicadores foram:

  • cobertura do solo com vegetação nativa, em porcentagem;
  • densidade de indivíduos nativos regenerantes¹, em indivíduos por hectare;
  • número de espécies nativas regenerantes¹;
  • identificação botânica dos indivíduos arbóreos regenerantes, sempre que possível pelo menos no nível de gênero taxonômico;
    [¹] Consideramos como regenerantes tanto os indivíduos plantados como os de crescimento espontâneo.

Outros indicadores que observamos:

  • percentual estimado de cobertura do solo por herbáceas invasoras e herbáceas superdominantes;
  • diâmetro e altura de indivíduos com DAP>=5cm;
  • avaliação visual da estrutura do solo - protocolo VESS (visual evaluation of soil structure)
  • registro de danos à vegetação ocasionados por fogo, tempestades, geadas, secas, ataques por animais, entre outros fatores que possam prejudicar o desenvolvimento dos regenerantes.

Os resultados dos indicadores de monitoramento foram comparados entre os diferentes esquemas de manejo para restauração, a saber:

Nome do esquema de manejo Código Número de réplicas (áreas com o mesmo esquema de manejo)
Condução da regeneração em paisagem dominada por braquiária - tratamento 1 T1 6
Condução da regeneração em paisagem dominada por braquiária - tratamento 2 T2 6
Condução da regeneração em paisagem dominada por braquiária - tratamento 3 T3 6
Condução da regeneração em paisagem dominada por samambaia- tratamento 1 S1 2
Condução da regeneração em paisagem dominada por samambaia- tratamento 2 S2 2
Plantio em área total com mudas PT 21

Para detalhes sobre cada esquema de manejo, veja a página Restauração Ecológica

Sabemos que cada uma dessas áreas não é totalmente homogênea em relação à infinidade de fatores ambientais que podem interferir no estabelecimento e crescimento das plantas, como por exemplo relevo, condições preexistentes de solo e vegetação, umidade, insolação, etc. Contudo, a fim de controlar o máximo possível de variáveis, todas as ações feitas em cada tratamento de condução da regeneração foram repetidas nas outras localidades. Assim, quando, por exemplo, foi feita a adubação verde no T2 de uma localidade, esse mesmo procedimento era repetido no T2 das outras 5 áreas. Desta forma, conseguimos analisar comparativamente a eficácia de cada técnica (tratamento).

Já nas áreas com plantio total de mudas (PT) as situações foram menos controladas. No entanto, esperamos que o fato de haver uma quantidade maior de áreas sob esse esquema de manejo possa reduzir o efeito estatístico dessas variações.

Resultados e discussões
Cobertura do solo com vegetação nativa

O indicador cobertura do solo com vegetação nativa (percentual) é calculado pelo segmento de projeção das copas de árvores e arbustos regenerantes sobre a linha central das parcelas de 25m, extrapolada para percentual dentro de cada parcela de 100 m2, e calculada a média das parcelas como estimativa do percentual de cobertura em cada área em restauração. Segundo a legislação do Estado de SP (Resolução SMA 32/2014), o valor mínimo que este indicador deve apresentar em áreas com até 3 anos de implantação é de 15% e o adequado é acima de 80%.

Esquema exemplificando a análise do indicador “cobertura do solo com vegetação nativa” em uma parcela com presença de clareira e espécies exóticas. A cobertura do solo é a área do solo coberta pela copa das espécies nativas que, neste exemplo, corresponde a 14,5 metros, ou seja, 58%. (Fonte: Portaria CBRN 01/2015)

Os resultados apresentados nos gráficos a seguir permitem observar o desenvolvimento das áreas em 2022, 2023 e 2024, de acordo com a técnica de restauração utilizada (tratamento). Lembrando que nem todas as áreas foram monitoradas em 2022, pois só foram implantadas no 2o semestre de 2022, e que algumas áreas apresentaram valor zero nesse indicador.

  • Gráfico: PT: plantio em área total; S1 e S2: condução da regeneração natural em áreas dominadas por samambaia; T1, T2, T3: condução da regeneração natural em áreas dominadas por braquiária. Dica: mova a barra inferior do gráfico para aumentar os detalhes do gráfico

Embora haja variações entre os resultados observados em cada área, a média dos valores encontrados em cada tratamento indica alguns resultados consistentes para esse indicador:

  • Com exceção do T2, todos os tratamentos alcançaram em 2024 o valor mínimo indicado na legislação paulista (15%);
  • O plantio total, como esperado, apresentou melhor cobertura já no primeiro ano, mas em 2024 já foi superado pelos tratamentos S1 e S2 (áreas dominadas por samambaias, em condução da regeneração natural);
  • As áreas dominadas por braquiária apresentaram desenvolvimento mais lento do que as áreas dominadas por samambaias na condução da regeneração natural;
  • Os tratamentos em condução da regeneração natural com custo mais baixo (S1 e T1), que envolveram apenas o manejo das áreas com roçada, coroamento e calagem, apresentaram desenvolvimento satisfatório para esse indicador;

Estes resultados fornecem evidências de que é possível reduzir os custos da restauração garantindo uma boa cobertura do solo com vegetação nativa, por meio da condução de regeneração natural, sobretudo em áreas próximas a fragmentos de mata mais bem conservada, como é o caso das áreas dominadas por samambaias do projeto Reflorestar. Logicamente, deveremos analisar cuidadosamente os casos das áreas em que esse indicador apresentou baixa performance, para compreender melhor em que situações esse método não foi efetivo e quais as ações devem ser tomadas para melhorar seu desempenho.

  • Tabela: Valores médios, por tratamento, do indicador cobertura do solo com vegetação nativa, em valores percentuais (PT: plantio em área total; S1 e S2: condução da regeneração natural em áreas dominadas por samambaia; T1, T2, T3: condução da regeneração natural em áreas dominadas por braquiária)
PT S1 S2 T1 T2 T3
Cobertura média (ind/ha) – 2022 14 3 1 1 0 9
Cobertura média (ind/ha) – 2023 22 14 18 6 9 3
Cobertura média (ind/ha) – 2024 27 32 30 15 13 15
Custo (R$/ha) 31.169 12.069 17.159 9.771 10.911 21.052
  • Gráfico: Cobertura por árvores e arbustos nativos em 2022, 2023 e 2024 - os valores são apresentados pela porcentagem média das áreas em cada tratamento. Os valores em reais são os custos médios por hectare, em cada tratamento.

Densidade de indivíduos nativos regenerantes

O indicador densidade de indivíduos nativos regenerantes foi estimado com base na contagem de árvores e arbustos de espécies nativas, presentes nas parcelas de 100m2. A média dos valores encontrados nas parcelas foi usada para calcular a densidade expressa em número de indivíduos por hectare.
A legislação paulista (Resolução SMA 32/2014) preconiza que este indicador deve apresentar, em áreas com até 3 anos de implantação, o mínimo de 200 indivíduos por hectare; acima de 3.000 ind./ha a área já pode ser considerada recomposta.

Embora haja variações entre os resultados observados em cada área, a média dos valores encontrados em cada tratamento indica alguns resultados consistentes para esse indicador: As áreas monitoradas alcançaram a densidade mínima considerada adequada para projetos de 3 anos, sendo que boa parte delas já superou o valor utilizado para atestar a recomposição - 3.000 ind/ha.

Os tratamentos S1 e S2 apresentaram o melhor desempenho também para este indicador, já acima de 3.000 ind./ha;
O tratamento T3, que tem manejo mais intenso entre as áreas dominadas por braquiária em condução de regeneração, teve um desempenho melhor do que o plantio total (PT), considerando os valores médios.

Estes resultados reforçam as evidências de que é possível, por meio da condução de regeneração natural, reduzir os custos da restauração garantindo, além de uma boa cobertura do solo, também uma boa densidade de indivíduos por hectare.

  • Tabela: Valores médios, por tratamento, do indicador densidade de indivíduos nativos regenerantes, expresso em número de indivíduos por hectare (PT: plantio em área total; S1 e S2: condução da regeneração natural em áreas dominadas por samambaia; T1, T2, T3: condução da regeneração natural em áreas dominadas por braquiária)
PT S1 S2 T1 T2 T3
Densidade média (ind/ha) – 2022 1.303 617 667 1.140 404 950
Densidade média (ind/ha) – 2023 2.187 4.325 3.650 1.840 1.780 2.220
Densidade média (ind/ha) – 2024 2.418 5.467 3.238 1.708 1.142 2.575
Custo (R$/ha) 31.169 12.069 17.159 9.771 10.911 21.052
  • Gráfico: Densidade de árvores e arbustos em 2022, 2023 e 2024 - os valores são apresentados pelo número médio por hectare, dos indivíduos encontrados em cada tratamento. Os valores em reais são os custos médios por hectare, em cada tratamento.

Número de espécies nativas regenerantes (riqueza)

Para o cálculo do indicador riqueza contamos o número de espécies nativas regenerantes (arbóreas e arbustivas) presentes nas parcelas de cada área em restauração.
A legislação paulista considera adequado que as áreas em restauração com até 3 anos de implantação tenham um mínimo de 3 espécies; acima de 30 espécies é o valor que se espera que a área alcance em até 20 anos. Assim, para ser considerada restaurada, uma área de floresta ombrófila deve apresentar, no prazo de até 20 anos, pelo menos 30 espécies nativas regenerantes, 3.000 indivíduos nativos regenerantes por hectare e 80% de cobertura pelas copas de árvores e arbustos.

Se considerada a média das áreas, destacamos os seguintes resultados para o indicador de riqueza:

  • Todos os tratamentos superaram o esperado para áreas com 3 anos de implantação;
  • Como já era esperado, os tratamentos em que houve plantio de mudas (PT, S2 e T3) apresentaram os melhores desempenhos para este indicador, com destaque para PT e S2, que tiveram desempenho equivalente.
  • Tabela: Valores médios, por tratamento, do indicador riqueza (número de espécies nativas regenerantes), expresso em número de espécies encontradas na área em restauração (PT: plantio em área total; S1 e S2: condução da regeneração natural em áreas dominadas por samambaia; T1, T2, T3: condução da regeneração natural em áreas dominadas por braquiária)
PT S1 S2 T1 T2 T3
Riqueza média - 2022 14 8 9 6 4 3
Riqueza média - 2023 25 14 17 7 5 10
Riqueza média - 2024 28 17 28 8 5 13
Custo (R$/ha) 31.169 12.069 17.159 9.771 10.911 21.052

Identificação taxonômica

Embora pela legislação (Res. SMA 32) a identificação de espécies não seja um requisito (apenas é requisito a contagem de morfoespécies por área), optamos pela identificação sempre que possível, a fim de viabilizar análises mais sofisticadas, como a comparação da diversidade florística entre diferentes áreas e das alterações em cada área ao longo do tempo. Portanto, procuramos fazer a identificação no nível taxonômico mais detalhado possível (no mínimo família, mas preferencialmente gênero e espécie).

A identificação taxonômica foi feita por 2 botânicos profissionais, que analisaram as fotos tiradas pela equipe de campo. Todas as fotografias foram analisadas pelos 2 botânicos, sendo que cada um fez a primeira identificação em metade das fotos e depois um conferiu a identificação que o outro havia dado. Esse procedimento aumentou a acurácia das identificações.

Identificamos 274 espécies de 129 gêneros em 41 famílias botânicas, com a predominância de Asteraceae, Fabaceae e Melastomataceae (52% dos indivíduos pertencem a essas famílias).

Prosseguiremos com o refinamento da análise desses dados, no sentido de verificar as diferenças dos táxons predominantes nas áreas e nos tratamentos; as síndromes de polinização e dispersão dos táxons encontrados, o que dará indicativos quanto ao potencial de atração de fauna nas diferentes áreas; bem como outros parâmetros que indicarão a eventual necessidade de enriquecimento ou complementação com espécies que desempenhem funções ecológicas ausentes ou pouco abundantes na comunidade vegetal.

Esperamos que nossos parceiros pesquisadores acadêmicos possam colaborar para extrair conclusões mais aprofundadas a partir dos dados já coletados.


Conclusões gerais e considerações

Nossos resultados indicam que é possível reduzir os custos da restauração por meio da condução de regeneração natural, garantindo um desenvolvimento satisfatório da vegetação, em níveis comparáveis ou até superiores aos alcançados por meio do plantio total. A tabela a seguir resume os valores médios alcançados em 2024 para os 3 principais indicadores analisados, onde é possível comparar o desempenho e os custos de cada forma de manejo (tratamento) utilizada.

  • Tabela: Valores médios de 2024, por tratamento, dos indicadores cobertura do solo com vegetação nativa, densidade de indivíduos nativos regenerantes e riqueza (número de espécies nativas regenerantes), seus respectivos valores de referência e os custos médios por hectare de cada tratamento (PT: plantio em área total; S1 e S2: condução da regeneração natural em áreas dominadas por samambaia; T1, T2, T3: condução da regeneração natural em áreas dominadas por braquiária)
Tratamento valores-referência
PT S1 S2 T1 T2 T3 mínimo desejável
Cobertura (%) 27 32 30 15 13 15 15 80
Densidade (ind./ha) 2418 5467 3238 1708 1142 2575 200 3000
Riqueza (núm. espécies) 28 17 28 8 5 13 3 30
Custo (R$/ha) 31.169 12.069 17.159 9.771 10.911 21.052 - -

Os resultados foram especialmente promissores nas áreas dominadas por samambaias localizadas próximas a fragmentos de mata mais bem conservada. O sistema de manejo que utilizamos foi efetivo para quebrar a resiliência das samambaias que dominavam essas áreas há mais de uma década e, com isso, as plantas regenerantes conseguiram se estabelecer rapidamente. Já no caso das áreas dominadas por braquiária, o desenvolvimento das regenerantes mostrou-se comparativamente mais lento. Ainda assim, foi satisfatório o desempenho nos indicadores que analisamos.

Deveremos avaliar cuidadosamente os casos específicos das áreas em que os indicadores tiveram baixo desempenho, a fim de compreender e sanar as deficiências. Esperamos em breve trazer análises mais aprofundadas, capazes de incluir fatores como o relevo e a distância de fragmentos florestais, dando indicações mais precisas que ajudem a aprimorar o diagnóstico das áreas nos próximos projetos, para que possamos utilizar as técnicas de baixo custo em mais situações, confiando que o desenvolvimento das áreas seja o melhor possível.

Devemos destacar que todos os esquemas de manejo que utilizamos no Reflorestar para a condução da regeneração natural (tratamentos S1, S2, T1, T2 e T3) tiveram mais de 80% do custo investido em mão de obra local (vide custos da condução). Assim, além da redução dos custos em si, direcionamos os recursos para fomentar os elos locais da cadeia da restauração, em detrimento de aportes externos de insumos. Isso é importante também do ponto de vista da governança e processos formativos, alinhados aos princípios agroecológicos que orientam o trabalho da Akarui.

Já garantimos recursos financeiros para monitorar novamente as mesmas áreas em 2025, trazendo uma camada adicional na série de dados, o que irá fortalecer as conclusões deste trabalho. Deveremos buscar recursos adicionais para seguir no trabalho de monitoramento nos próximos anos.

Destacamos também o ineditismo desta proposta, que está gerando conhecimentos que trarão benefícios duradouros para a restauração no Vale do Paraíba, e esperamos que se ampliem no contexto da Mata Atlântica. Agradecemos especialmente ao time de restauração do WWF-Brasil, que confiou na capacidade da Akarui de realizar o projeto e nos apoiou em todos os momentos.


Análise comparativa de custo-efetividade: semeadura a lanço e plantio de Juçara

As áreas em enriquecimento com Juçara foram divididas em dois tratamentos cada, conforme detalhado na seção Enriquecimento com Nativas.
Realizamos o monitoramento de germinação e estabelecimento das sementes de Juçara em dezembro de 2023 e setembro de 2024. O protocolo utilizado foi uma adaptação do método de avaliação de restaurações ecológicas da portaria CBRN 01 2015, feito pela Fundação Florestal.

Foram amostrados os primeiros estágios de vida do palmito nas parcelas – sementes e plântulas, separadas em 3 classes de desenvolvimento:

  • semente não germinada (seca ou viva);
  • semente germinando;
  • plântula com folhas palmadas, com no máximo 3 folhas.

Metodologia de amostragem
Foram amostradas 6 parcelas em cada área semeada, sendo 3 no tratamento J1 (lanço) e 3 no tratamento J2 (plantio). As parcelas foram retangulares com dimensões de 25 metros por 4 metros, dispostas de forma aleatória e perpendiculares à trilha (transecto) utilizada para percorrer a área do repovoamento, ou seja, se a trilha de semeadura foi realizada no sentido da curva de nível, a parcela de amostragem foi realizada “morro abaixo”.

Com a identificação e tabulação dos indivíduos encontrados em cada parcela foi calculada a densidade (indivíduos por hectare) de sementes ou plântulas encontradas nos 3 estágios iniciais da palmeira. Comparando às quantidades de sementes utilizadas no lanço e no plantio, foi possível ter parâmetros sobre a efetividade dos dois tratamentos em cada área. A tabela e a figura a seguir resumem os resultados para cada área e também a média de cada tratamento.

É importante lembrar que as áreas semeadas para este experimento não tinham presença prévia de Juçara; portanto todas as sementes e plântulas encontradas no monitoramento são resultantes da semeadura feita neste projeto.

Resultados e discussões
Nº sementes utilizadas - por hectare (2022+2023) Monitoramento ano 2 (2023)- indivíduos por hectare Relação quantidade sementes lançadas ou plantadas por indivíduos monitorados (%) - 2023 Nº sementes utilizadas - por hectare (2022+23+24) Monitoramento ano 3 (2024)- indivíduos por hectare Relação quantidade sementes lançadas ou plantadas por indivíduos monitorados (%) - 2024
Lanço Plantio Lanço Plantio Lanço Plantio Lanço Plantio Lanço Plantio Lanço Plantio
Propriedade 1 - 1,5 ha 20.000 4.000 6.567 2.600 32,8 65,0 30.000 6.000 6.933 3.400 23,1 56,7
Propriedade 2 - 2 ha 20.000 4.000 900 1.367 4,5 34,2 30.000 6.000 933 2.333 3,1 38,9
Propriedade 3 - 1,5 ha 20.000 4.000 3.800 900 19,0 22,5 30.000 6.000 4.133 3.400 13,8 56,7
Média 20.000 4.000 3.756 1.622 18,8 40,6 30.000 6.000 4.000 3.044 13,3 50,7

Embora, em números absolutos, tenhamos encontrado mais plântulas e sementes germinadas no tratamento J1 (lanço), a proporção entre a quantidade de sementes utilizadas e o número de indivíduos monitorados deixa claro que o rendimento do tratamento J2 (plantio em covetas) foi superior em todas as áreas. Além disso, como pode ser observado na página sobre a implantação do Enriquecimento com nativas, o custo por hectare do tratamento J2 é menor.

Contudo, há que se ponderar que o esforço (mão de obra) para realizar o plantio em covetas é maior do que no lanço, até mesmo porque o lanço pode ser feito com uso de drones. No caso de áreas de difícil acesso, ou muito extensas, talvez a semeadura por plantio seja impraticável. Mas em casos como os deste projeto, em que as áreas são relativamente pequenas e possíveis de adentrar, provavelmente é mais vantajoso investir esforços adicionais para a realização de semeadura por plantio. Assim, nos próximos testes iremos utilizar um espaçamento menor entre as covetas, visando aumentar a quantidade de sementes por hectare no plantio, consequentemente aumentando o número absoluto de plântulas por hectare.

Devemos seguir monitorando o desenvolvimento dessas plântulas e a germinação das sementes em anos futuros, para verificar se essa melhor performance do tratamento J2 se mantém ao longo do tempo. Também iremos comparar nossos resultados aos obtidos pela Fundação Florestal em projetos recentes que vêm sendo monitorados com uso dos mesmos protocolos de coleta de dados.

Recomendamos observar os princípios de contratação de mão de obra local, aquisição de sementes provenientes da mesma região e uso das sementes pouco tempo após a coleta.


Análise de solo

A restauração florestal que convencionalmente é praticada hoje em dia demanda grandes quantidades de insumos importados de fora da propriedade, com alto custo econômico, ambiental e social. Para diminuir tais custos é imprescindível olharmos para a saúde do solo.

No solo há uma estreita dependência entre as propriedades físicas e químicas, a microvida, a topografia, a raiz vegetal e o porte da vegetação. É um ciclo permanente de interdependência, no qual a modificação de um fator provoca a alteração dos demais. Um solo depauperado (química e biologicamente) e decaído (geralmente adensado) possui, portanto, outra flora, diferente de um solo rico e fofo.

Em muitos casos encontram-se sais minerais em quantidades suficientes no solo, mas inaproveitáveis para os vegetais, pois esse aproveitamento depende de muitos fatores como textura e estrutura do solo; teor húmico e microvida; microclima e umidade; pH; e do potencial de absorção de água.

Entre 2022 e 2023 realizamos a primeira coleta de solo nas áreas em restauração como parte da pesquisa realizada. Nosso objetivo foi gerar dados para compreender como se dá a dinâmica de nutrientes no solo como resultado de diferentes técnicas, fazendo uma comparação do estado nutricional das áreas no início do projeto e outra ao final, ou seja, serão duas amostragens de solo para a comparação inicial e final. Contudo, a segunda coleta ainda não foi realizada, e está prevista para novembro de 2025.

Como ainda não temos a segunda amostragem, apresentaremos aqui uma comparação entre a condição encontrada nos solos amostrados nas áreas em restauração e as condições de solo que podem ser consideradas ideais de acordo com a abordagem do Equilíbrio de Bases, de William Albrecht. Essa abordagem serve como parâmetro para comparar os solos das áreas do projeto Reflorestar às condições das quais esperamos que eles se aproximem, à medida que o processo de restauração se estabeleça nas áreas.

Coleta de solo

Coletamos solos em todas as 25 propriedades do projeto. As amostras foram coletadas com trado holandês em duas profundidades: 0-20 cm e 20-40 cm, de forma que tenhamos informações para entender a dinâmica de nutrientes na camada superficial e numa mais profunda (onde se encontram as raízes das mudas nativas).

Solo coletado em área de samambaia | Trado holandês

Foram coletadas 10 amostras simples em cada área, de locais escolhidos ao acaso percorrendo a gleba em zigue-zague de maneira uniforme. A coleta foi realizada da seguinte forma:

  • Limpeza da superfície do local de amostragem, retirando a vegetação, galhos e pedras, sem remover a camada superficial do solo;
  • Introdução do trado holandês até 20 cm de profundidade, essa terra foi colocada em uma sacola (com identificação da profundidade);
  • Introdução do trado para retirada da camada mais profunda do solo (20-40cm) e armazenado em outra sacola, devidamente identificada.
  • Todos os buracos foram cobertos novamente com a palhada retirada do local.
Amostras encaminhadas para análise

Ao final da coleta as sub-amostras de cada faixa de profundidade foram misturadas em um balde e retirada uma alíquota com cerca de 400g de solo.

Desse procedimento resultaram amostras compostas representativas da camada superficial (0-20 cm) e mais profunda (20-40). O restante foi descartado na própria área.
As amostras foram encaminhadas para análise no Laboratório de Solos da Universidade de Taubaté (Unitau) e para o Laboratório IBRA - Instituto Brasileiro de Análise.

Equilíbrio de Bases

A ideia sobre a manutenção do equilíbrio de bases (Nutrientes na CTC - capacidade de troca catiônica) foi pela primeira vez apresentada na década de 1950 pelo Prof. Dr. William Albrecht, pioneiro no uso de inoculantes em leguminosas que, trabalhando com a fração húmica do solo, observou que ela apresentava proporções similares às observadas na figura acima. Posteriormente, ele demonstrou que tais proporções de bases eram justamente as que resultavam nas maiores produções, sendo as mesmas encontradas na fração mais fértil do solo, isto é, a fração húmica.

A capacidade de troca iônica dos solos representa a capacidade de liberação gradual de vários nutrientes, favorecendo a manutenção da fertilidade por um prolongado período e reduzindo ou evitando a ocorrência de efeitos tóxicos decorrentes da aplicação de fertilizantes. Se a maior parte da CTC do solo está ocupada por cátions essenciais como Cálcio, Magnésio e Potássio (Ca²+, Mg²+ e K+), pode-se dizer que esse é um solo bom para a nutrição das plantas. Por outro lado, se grande parte da CTC está ocupada por cátions potencialmente tóxicos como hidrogênio e alumínio (H+ e Al³+) este será um solo pobre. Um valor baixo de CTC indica que o solo tem pequena capacidade para reter cátions em forma trocável e, portanto, as adubações e as calagens não devem ser feitas em grandes quantidades de uma só vez.

Resultados e discussões

Os gráficos a seguir ilustram as condições ideais de equilíbrio de bases (centro), bem como a situação dos solos de duas áreas amostradas a profundidade 0-20 cm. Esses solos foram escolhidos por apresentarem o pior (esquerda) e o melhor (direita) teores de nutrientes na CTC dentre as amostras que analisamos.

Podemos perceber que o solo que encontramos em piores condições (esquerda) apresentou um teor de hidrogênio e alumínio (H+ e Al³+) muito acima do ideal e baixos teores dos demais nutrientes, principalmente de cálcio. Já o solo que encontramos em melhores condições (direita) ainda assim apresenta um teor de hidrogênio e alumínio muito acima do ideal.

Os altos teores de H+ e Al³+ estão associados à acidificação, que acontece naturalmente devido ao fato dos solos brasileiros estarem sob clima tropical, sujeito à ação das chuvas e de altas temperaturas o ano inteiro. Todos os solos ‘envelhecem’ ou sofrem intemperismo e a acidificação é parte deste processo natural. Dessa forma, entendemos porque os dois solos (assim como grande parte de todos os solos amostrados) têm alto teor de hidrogênio + alumínio (H+ e Al³+).

Outros fatores que ocasionam variação das características do solo estão relacionados aos seus processos de formação e com os efeitos do manejo.

Vale lembrar a explicação sobre a CTC que enfatiza que a predominância de cátions (íons com carga +) potencialmente tóxicos como hidrogênio e alumínio (H+ e Al³+) resulta em um solo ‘pobre’, pois este solo tem baixa capacidade de reter os outros cátions (Ca²+, Mg²+ e K+), os macronutrientes, que são nutrientes utilizados em grandes quantidades pelas plantas.

Florestas tropicais, mesmo em solos de baixa fertilidade, não apresentam sintomas de deficiências nutricionais, devido à decomposição do material orgânico ao longo do ano, associada a uma pequena perda por lixiviação e absorção de elementos do solo pela vegetação. Com isto, observa-se que, nos solos sob floresta, as perdas de nutrientes do ecossistema são menores em relação àqueles sob pastagem, principalmente pela heterogeneidade da composição florística.

Toda essa região em que estamos um dia foi floresta e, com o passar do tempo, os solos tiveram diferentes usos, com diferentes intensidades de manejo e desgaste. Os solos vão responder diferentemente, de acordo com seu histórico de uso e fatores de formação, por isso essa perda de nutrientes acontece o tempo todo mantendo o solo desequilibrado.

Nossa intenção em olhar para a química do solo está em observar como essa química é alterada de acordo com o manejo em cada método de restauração. Podemos citar aqui alguns dos manejos realizados:

  • nas áreas de condução da restauração não utilizamos adubação química sintética nem orgânica, apenas a calagem da área total visando o aumento do pH. Já nas áreas em plantio total, adubamos o berço com Yoorin (fósforo), torta de mamona (nitrogênio) e calcário dolomítico, sendo que as dosagens utilizadas em cada área variaram de acordo com o diagnóstico.
  • para estimular a biologia do solo realizamos o manejo da palhada decorrente das roçadas da braquiária, uma vez que avaliamos a necessidade da roçada deixando a gramínea crescer a ponto de podermos usar a palhada nas coroas das mudas plantadas, ou mesmo sobre o solo formando uma espessa cobertura, favorecendo a retenção de umidade, criando microclima para microvida que vai decompor essa matéria seca e disponibilizar nutrientes para as plantas.

Por fim, entendemos que nossa função na restauração ecológica é de devolver a vida desse ambiente, para que os organismos do solo façam sua função de reequilibrar esse sistema e restabelecer a fertilidade e a vitalidade dos solos.